segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

JOÃO BOSCO AMARAL ALCANÇA EDGAR POE EM "OLHO" E VENCE FESTIVAL NACIONAL IPITANGA DE TEATRO NA BAHIA


Por Rogério Borges

Olho, da Cia. Teatral Oops!.., de Goiânia (GO), grande vencedor da sexta edição do Festival Nacional Ipitanga de Teatro (FIT), é o espetáculo que o gênio do norte-americano Edgar Allan Poe, mestre do estilo gótico do século 19, teria escrito. Numa adaptação do conto “The Tell-Tale Heart” (ou coração delator), a peça realiza a façanha de transpor para o palco o terror que fez de Poe uma referência do gênero.

Melhor espetáculo do festival, Olho deu a Ivan Lima o prêmio de melhor direção, a João Bosco Amaral o de melhor ator e faturou ainda outros quatro prêmios. Levou os troféus de melhor trilha sonora (Lino Calaça), melhor cenário (Jeová de Lucena) e melhor iluminação (João Bosco Amaral). A montagem conquistou ainda uma indicação a Destaque do Festival com Edelweiss Vieira, que assina a preparação corporal de João Bosco.

O conto investe na psicologia do terror para castigar um assassino sem sentimento de culpa – mas encurralado pela sua própria insanidade, numa decorrência natural do processo mesmo que levou ao assassinato. O que o texto trabalha é a fixação de um mordomo pelo olho cego de seu patrão.

A quase ausência de recursos ao horror explícito – coisa que poderia ser tranquilamente transcrita para o palco – representa um desafio plenamente vencido neste Olho. A atuação de João Bosco Amaral, pedra angular do espetáculo, tem o sofisticado apoio de todos os aspectos técnicos, incluindo os que não foram premiados.

No cenário, uma imensa e sombria mansão está perfeitamente dimensionada pelas sombras projetadas. O grande relógio suspenso no centro absoluto do palco é o próprio olho a fixar e incomodar o público. A iluminação, que podia ter ficado pela ambientação lúgubre, está também a serviço dos personagens. João Bosco está sozinho em palco, mas é impossível deixar de ver o velho na cadeira vazia.

A produção apurada não é, aqui, mero preciosismo ou exibição de talento, mas uma necessidade absoluta para alcançar Edgar Allan Poe. A referência ao mestre impõe uma responsabilidade que facilmente teria sido descumprida.

Mas fundamental é o desempenho do ator. O ponto alto da performance está na sequência em que o mordomo descreve o esgueirar-se pela porta do quarto para observar o olho cego do patrão, que dorme. O turbilhão insano que dá personalidade ao assassino fica marcado na descrição do horror que o olho lhe causa. A própria platéia mataria o velho apenas para se livrar daquele sentimento incômodo. É nisso que o espetáculo aposta – e vence.

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